VIVER O FINAL DO ANO COM ESPÍRITO CRISTÃO

02/12/2025 às 10:26h

O final do ano civil, que culmina em 31 de dezembro, representa não somente o fechamento de um ciclo temporal, mas uma oportunidade privilegiada para os cristãos revisarem sua jornada espiritual e se alinharem ao mistério da salvação. Na tradição católica, esse momento é impregnado de um duplo sentimento: penitência pelos pecados cometidos e gratidão pelas graças recebidas de Deus ao longo do ano. Assim, viver esse período com autenticidade cristã significa transformar o exame do ano em um ato de conversão, preparando o coração para viver o novo ano, com um novo espírito de fidelidade a Deus e aos irmãos.

A importância dessa vivência reside na consciência de que o tempo não é neutro, mas “tocado” por Cristo, tornando-se kairós, o tempo da salvação. É necessário enfatizar que o final do ano nos leva a contemplar o fim da jornada pessoal, ecoando as palavras do Eclesiastes: “há um tempo para nascer e um tempo para morrer” (Ec 3,2). Essa perspectiva nos liberta da ilusão de um tempo puramente humano, convidando-nos a um “exame de consciência” que inclui agradecer pelos benefícios divinos e pedir perdão pelas faltas. Sem essa atitude, corremos o risco de nos perdermos no barulho das festas, esquecendo que a verdadeira alegria cristã brota da humildade e da confiança na providência de Deus. Como nos recorda o Papa São Paulo VI, devemos “decifrar os sinais dos tempos” (Mt 16,3) para discernir os desígnios divinos em nossa história pessoal e coletiva.

No contexto litúrgico, o final do ano se entrelaça com o Advento, que começou no primeiro domingo do Advento. Essa transição reforça a ideia de que o “fim” é sempre um “princípio” na fé: o fim do ano civil nos impulsiona à vigilância, recordando o retorno de Cristo. O Papa São João Paulo II, em 1997, descrevia esse momento como uma “pausa espiritual” para refletir sobre o ano como fragmento da história da salvação, em comunhão com toda a Igreja. Viver com espírito cristão, portanto, é rejeitar a superficialidade consumista e abraçar a sobriedade evangélica, especialmente em um mundo que transforma o Natal em mero comércio.

Para não perder o foco da fé nesse período, a Igreja sugere práticas de piedade que harmonizam a tradição litúrgica com a devoção pessoal. Primeiramente, teremos a oportunidade de viver bem o período do Advento e do Natal, com um sentimento de gratidão pela vinda do Senhor Jesus “para o nosso bem”. Podemos pensar também em fazer um exame de consciência do ano que passou. No final do ano, reservar tempo para uma revisão orante: listar as graças recebidas (saúde, família, oportunidades de serviço) e as omissões ou pecados (egoísmo, preguiça espiritual, injustiças). O Diretório sobre Piedade Popular recomenda que esse exame desperte “penitência e arrependimento pelas ocasiões de graças de Deus perdidas”, preparando o coração para a confissão sacramental.

Outra prática essencial é, para o final do ano, o canto do hino Te Deum, hino de louvor e ação de graças, tradicionalmente entoado em 31 de dezembro. Ele expressa a comunidade cristã louvando Deus “pelos benefícios recebidos ao longo do ano”, como uma “expressão comunitária de oração e recordação”.

Não esqueçamos também, neste período, das obras de misericórdia, que ancoram a fé na caridade concreta. Visitar os doentes, doar alimentos aos necessitados ou reconciliar-se com alguém ofendido, ecoando o chamado à conversão do Advento: “Arrependei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2).

Em conclusão, viver o final do ano com espírito cristão é um ato de liberdade: libertar-se do efêmero para abraçar o eterno. Essas práticas não são rituais vazios, mas caminhos para reacender a fé, evitando o desvio do consumismo. Que o Te Deum de louvor e o exame de consciência nos levem a um 2026 mais alinhado à vontade de Deus, em expectativa jubilosa do Salvador. Assim, o tempo se torna salvação, e nossa vida, um hino contínuo de gratidão.

 

 

 

Fonte: Dom Antonio Carlos Rossi keller